Depois de se ouvir e/ou ler um noticiário, ficamos, frequentemente, com um certo mau estar, porque as notícias transmitidas são quase sempre negativas. Experimenta-se medo, desânimo, desagrado e o número dos que assim nos sentimos, parece ser elevado.

Porque não nos unimos, nós cristãos, que conhecemos o segredo e a chave da esperança, para lutar contra corrente? São vários os meios a que podemos e devemos recorrer, mas opto por destacar e reforçar, sobretudo, a inspiração, a luz e a força que é para nós o Evangelho, sobretudo o mistério da Morte e da Ressurreição de Jesus; Ele pede-nos para sermos sal e luz do mundo; Deseja que as nossas boas obras, glorifiquem o Pai que está nos Céus; afirma com uma certeza impressionante: “Eu venci o mundo!”.

Serão precisas mais motivações? Por outro lado, é evidente que a proposta evangélica é a antítese do imobilismo, do conformismo e do desânimo! Daí a prece feita a partir da invocação “mas livrai-nos do mal”: livra-nos do mal do desalento, da insolidariedade e da moleza de carácter, da noite sem lua de sonhos e da obesidade de convicções demasiado seguras.

Constata-se e sente-se que há urgência de mudança na sociedade e a prová-lo estão as muitas notícias incentivadoras de iniciativas interessantes, de que são exemplo a Associação ‘ ACREDITA PORTUGAL’, criada por um grupo de Jovens recém licenciados, que tanto êxito está a ter, ou a reportagem passada há dias na TVI, testemunhando a criatividade, a iniciativa de várias pessoas, algumas nada jovens, que teimam em trazer Portugal, mais uma vez, para a linha da frente.

Estes sinais de mudança trazem-me um especial gozo, por me parecer, também, que honram a verdade. Eu vivo e trabalho inserida no Bairro 6 de Maio, Venda Nova, Amadora, juntamente com as Irmãs da Comunidade. É um Bairro pobre, degradado, problemático, mas é raro o dia em que não surgem gestos que constroem. Alguns deles passam despercebidos, mas outros são projectos de grande envergadura, generosidade e criatividade. A minha experiência é tão rica e intensa, que sinto um enorme desejo de ter tempo e possibilidades de fazer alguma publicação que o dê conhecer. Fazê-lo, não só vale a pena, como vale a alegria, até pelo efeito de “contágio” que possa ter, e todos precisamos deste tipo de contágio, que é, por sua vez, uma forma de reconhecimento a quem tem a coragem da prática desses gestos. Um amigo engenheiro partilhava, há dias, com uma alegria incontida e transformadora, que tinha, pela primeira vez, plantado alfaces, tomates e pimentos, nuns canteiros que tinha disponíveis. Dizia que acompanhar o nascer, o crescer e o poder comer o fruto do seu trabalho, lhe dava um prazer, que ele jamais poderia ter imaginado. Mas o que mais gozo lhe dava, dizia, era ver que os empregados da sua pequenina empresa, seguiram o seu exemplo e, algo comovido, afirmava que na Empresa todos se tinham tornado melhores.

Para exemplificar alguns dos “gestos que constroem”, que antes referi, escolho o Projecto da publicação do livro “Do outro lado da Linha”, que levou uma Magistrada e uma Fotógrafa profissional a fazer o possível e o impossível para, através dessa publicação, dar a conhecer o BOM dos Bairros. Nesse ano não houve férias para elas, investiram muito dinheiro, envolveram gente voluntária e, no fim de muita luta e entrega, o livro, de qualidade excelente, saiu a custo zero. A alegria com que vieram ao Centro Social oferecer toda a edição, é indescritível…de se ficar em silêncio!

Com o fruto da sua venda já se apoiaram vários estudantes universitários do Bairro que, de outro modo, não poderiam estudar. Neste ano, apoiam-se sete.

Outro gesto: No Natal duas amigas telefonaram a dizer que faziam parte de um grupo que tinha decidido não gastar dinheiro em prendas, e que o mesmo seria para ajudar alguém que precisasse. Demos-lhes várias propostas – necessidades não faltam! – e decidiram levar  mais de 200 crianças dos Bairros à Kidzania.

Não posso continuar! Tem que ser mesmo um livro! Mas o importante é que os “gestos que constroem”, graças a Deus, superabundam.

Irmã Deolinda Rodrigues
Comissão de Justiça e Paz-CIRP