«Sem sabermos para onde íamos, tentávamos adivinhar com base nas placas que íamos passando. Mal vimos a placa “Damaia”, suspeitávamos que seria um bairro social, no entanto jamais poderia imaginar o que iria vivenciar naquelas 48h. Não foi só o aspeto do bairro e as condições em que aqueles seres humanos viviam que ficará para sempre na minha memória como um marco de “realidades complicadas”, mas também ficará as pessoas que conheci.
Cruzei o meu caminho com pessoas do bairro, pessoas com sonhos e medos, como qualquer um de nós. Crianças e jovens felizes, cheias de esperança e sorridentes. Fui recebida com um carinho indescritível de pessoas que, apesar do pouco que têm em termos materiais, têm um amor ilimitado e contagiante. Senti, também, a dor, a revolta e o medo que carregavam consigo, por um lado, por abandonar toda aquela comunidade, todos aqueles metros quadrados, que por mais degradantes que fossem, eles retratavam a sua história, eles foram testemunhas de uma vida, e por outro lado, o medo do desconhecido, de não saberem o que se encontrava fora daquele bairro e se sentirem desprotegidos e pouco apoiados. Apesar da nossa perceção “de fora” daquele bairro, conheci gente que se orgulha de lá viver e que se sentem seguros com um sentido de comunidade e entreajuda muito grande. Outro marco desse fim-de-semana foram as irmãs que deram uma vida em pró daquele povo, ajudam sem querer nada em troca e contam as suas histórias com um orgulho, que senti que todos nós podemos fazer tanto pelo outro. Reforcei, mais uma vez, a filosofia relativista que tenho vindo a adotar. Como em todas as comunidades, há pessoas e pessoas. No entanto, mesmo as pessoas consideradas “más” pela sociedade, têm uma história e viveram uma realidade que os outros desconhecem e se tivéssemos, todos, vivido essa história, até que ponto não cometeríamos os mesmos atos? Soube de histórias de discriminação apenas porque diziam que viviam no Bairro 6 de Maio, estavam condenados por terem nascido onde não tiveram poder de escolha. É preciso dar a mão a estas pessoas, a estas crianças, a estes jovens e adultos. É preciso acreditar no seu potencial e antes de julgar, ouvir as suas histórias. Pois, todos nós ainda temos tanto a aprender com os outros. Por último, queria agradecer, mais uma vez, ao GASNova que me encheu o coração de esperança no poder de resiliência de cada um de nós e energia para ajudar o outro, que me mostrou realidades desconhecidas e que torna os meus dias tão especiais.»
Sofia Nunes